Quem sou eu

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Recife, PE, Brazil
É kinda pretensious dizer que se é artista. Sou menos artista que Bukowski ou Fernando Pessoa. Sou mais artista que Gianechini ou Debora Seco... Somewhere in the middle. Sou atento ao mundo e busco sempre descrevê-lo de alguma forma e com algum tom de lirismo.

sábado, 28 de agosto de 2010



São três da manhã.
Nova York está fria.
Estou remontando meu 38.
Costumo desmontá-lo às vezes. Para poder limpar o cano direito.
Freddy deve me ligar a qualquer instante. Quando isto acontecer, me encaminharei para o que será, talvez, minha última missão.
Essas coisas a gente não explica. Apenas sente. Há algo de estranho nesse caso. Algo que não junta as pontas. Um tom na voz de Freddy ligeiramente mais agudo.
Nunca pensei que seria por Freddy que eu seria mandado para os peixes.
Não que eu ligue.
Na minha profissão, quando você é marcado para ir, não importa por quem é. Você apenas vai.
Alguns tentam fugir. Se refugiar numa família rival...
Comigo não é assim. Se tem algo pelo o que eu prezo, além da buceta de Carmella, é a honra.
Três e vinte e seis. O telefone toca.
- Desce. Estamos aqui.
Coloco meu “pardessus” preto. Meu 38 por trás da minha calça. Puxo um cigarro do maço e desço. Freddy está fora do carro fumando o seu cigarro em meio a névoa nova-iorquina. No volante está Salvatore Picci e atrás Toni Bulldog.
- Qual é o nome da música que Fred Scotti canta no Canto di Malavita? Pergunta Freddy.
- Acho que é Canto di carcerato.
- Boa, rapaz! Sobe aí que não temos muito tempo.
Subo no carro. O clima é tenso.
O silêncio predomina. Acordo que possa ser por causa do horário. Mas fico alerta.
Pegamos a highway.
- Não íamos para o Queens? Pergunto.
Silêncio.
- Vamos para Nova Jersey. Diz Freddy finalmente.
Não pergunto nada. Não há nada a perguntar.
Eles vão me levar para o campo e me liquidar.
O padrinho não se convenceu de que eu não estivesse envolvido com os Gamberis no último golpe à carga de paletós italianos.
Claro, não é verdade.
Como eu disse: se tem algo pelo o que eu prezo além da buceta de Carmella...
Verifico mentalmente se deixei tudo certo para Carmella. A carta. O envelope com todo o dinheiro que consegui. As passagens para Napoli para ela e para Vitorio, o filho dela.
Caso eu chegue em casa vivo, terei tempo de recolher o envelope antes de ela acordar. Mas minhas esperanças estão muito pequenas. Highway, em direção a Jersey, às três e meia da manhã, na minha situação, meu amigo...
A estrada fora do carro é escura. Passamos em meio a um monte de milharal.
Já, já pararemos para Freddy mijar, penso eu.
“Leave the gun, take the canolli”... Já to vendo...
Na monotonia do zunzum do motor, começo a pensar na solução que eu não havia pensado até então. “Fuck proud!” Disse Marcellus em Pulp Fiction. Por que não?
Talvez eu pudesse reagir. Freddy não desconfiaria de mim. Ele acredita que eu tenho honra. E eu tenho!
Ora merda!
Mas tenho que pensar na minha pele...
Não seria fácil. Eu teria primeiro que eliminar o Bulldog. Em seguida, sem titubear, uma bala na cabeça de Freddy e outra na de Salvatore.
É algo que pode ser feito.
Só sinto por Freddy. Tínhamos uma relação muito boa. De freqüentar a família e tudo. Foi ele que me trouxe para os Campesinis quando eu estava afogado em necessidades.
E sinto por Salvatore também. Sua filha nasceu semana passada. Pobre Salvatore...
Pobre Salvatore o caralho! Ou sou eu ou é ele!
E também vai ser uma ótima oportunidade de apagar esse paquiderme filho-da-puta do Bulldog.
Tem que estar tudo muito bem planejado. Apago os caras e volto para casa antes das cinco. Acordo Carmella e Vitorino e sem esperar um minuto corremos para o cais. Destino: Napoli. Uma nova vida em meio ao ar puro da região da Campânia.
- Salvatore, encosta aí. Diz Freddy. Desliga os faróis.
Puta que pariu! Penso eu. Fudeu tudo!
Tenho de apagá-los agora! Se esperar para quando sairmos do carro, eles vão estar preparados para uma reação minha. Tem que ser agora!
- Marco, diz Freddy para mim, estamos esperando uma carga da pesada que está chegando de Miami. O assalto vai ser mais perigoso que de costume. É provável que tenha capangas no caminhão. Por isso dessa preparação toda. Você vai ficar na linha de frente com o Bulldog enquanto eu fico na retaguarda e Salvatore fica no carro esperando para dar partida se der alguma merda.
Fico atônito por um momento.
Um assalto à carga!
Eu todo preocupado pensando que estava marcado pra morrer e esses porras me dizem que vamos fazer um assalto! Mais um assalto!
Respiro aliviado.
Saio do carro, seguido pelo Bulldog e por Freddy.
Bulldog traz uma metralhadora AK-47 consigo.
Nos posicionamos e esperamos.
Com algum tempo de espera, no qual fumo alguns cigarros e olho com má vontade para o imbecil do Bulldog, o claro desponta no horizonte e aparece um caminhão ao longo da estrada.
Nos preparamos.
O assalto ocorre tranquilamente. Só dois capangas acompanhando o motorista. Nem tive que fazer nada. O Bulldog encheu o cú deles de bala. A carga era de brinquedos de pelúcia. Empanturrados de coca, claro.
Comemoramos a conquista com charuto.
Freddy manda o Bulldog ir dirigindo o caminhão.
Voltamos para o carro, Freddy e eu.
- Porra, Freddy! Eu pensava que vocês iam me apagar, caralho! Por causa daquele negócio todo da carga dos Armannis.
Freddy dá uma risada.
Eu rio também.
- Porra, Marco, diz ele rindo, você não acha que ia se livrar dessa né?
E Freddy aponta seu 45 para minha cabeça.
“Filho da puta!!” é a última coisa que penso antes de ter meus miolos estourados.

3 comentários:

  1. O jogo só acaba quando termina, já dizia o filósofo! ótimo texto, meu velho! espero te ver em breve! abraços

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  2. A última coisa que Nick Belane ver, depois de ser baleado, é o tão afamado Pardal Vermelho. Pulp, livro de Charles Bukowski, já leu?

    Muito massa seu texto!
    Ah, quem tá falando aqui é Renan, lembra-lembra? haha

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  3. Por acabo, numa madruga de domingo achei seu blog. Gostaria de lhe dar os parabéns. Seus textos, são ótimos!

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