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É kinda pretensious dizer que se é artista. Sou menos artista que Bukowski ou Fernando Pessoa. Sou mais artista que Gianechini ou Debora Seco... Somewhere in the middle. Sou atento ao mundo e busco sempre descrevê-lo de alguma forma e com algum tom de lirismo.

segunda-feira, 26 de julho de 2010

Perfume.

Foi pro show sozinho.
Era um encontro de artistas que haviam marcado muito sua vida e levar qualquer pessoa para sentar ao seu lado só poderia prejudicar sua atenção naquele momento tão especial. Por isso, pegou o carro sozinho, bebeu tranquilamente um cappuccino num café ao lado do teatro e, quando deu a hora, entrou.

O teatro estava praticamente lotado. As últimas cadeiras disponíveis iam sendo ocupadas aos poucos pelas pessoas que chegavam, em sua maioria casais. Permaneceu imóvel em sua cadeira, olhando para o nada, à espera do segundo toque, que devia ressoar a qualquer momento. Pensou quaisquer que sejam os pensamentos que se pode ter durante esses tempos mortos do dia-a-dia. Em meio ao murmúrio de pré-apresentação que dominava a sala, algumas pessoas ainda passavam por ele, procurando seus assentos. E foi numa dessas passadas que ele sentiu. Um aroma, um perfume. Parou para pensar de onde ele conhecia tão bem este cheiro. Era, com certeza, de algum lugar longínquo de seu passado. Mas não sabia ao certo de onde.

Ressoou o segundo toque. Em seguida o terceiro.
Entraram os músicos. Aplausos, palavras iniciais, aplausos, violão.
A música o embebeu por completo. A cada palavra da canção, resgatava os diversos significados que ela já havia tido no decorrer de sua vida. E então, de súbito, lhe veio: Maria Edwiges!

Era o perfume de Marie Edwiges! Sua primeira namorada, que ele havia tido aos treze anos, na Suíça, quando morara lá! Havia dez anos que não sentia esse cheiro! Um perfume doce, essencialmente feminino, que, se permitindo dar um palpite, ele julgou ser de pêssego. Embora de cheiro ele entendesse pouco.

Ora lá estava Marie Edwiges, dez anos depois. Presente pelo cheiro! Lembrou-se de seu primeiro beijo com ela – que havia sido seu segundo beijo na vida. O primeiro fora com uma prima mais velha. “Pra treinar”... Suas idas de bicicleta a sua casa. Os “passeios com o cachorro” que iam dar para que pudessem se beijar. E a vergonha. Quanta vergonha! Vergonha que seus pais o vissem com ela, vergonha de falar no telefone com ela quando seus pais estavam por perto...

O que teria acontecido com Marie Edwiges? Dos treze aos vinte e três. Uma vida de diferença. O que estaria ela fazendo? Que tipo de música gostava de escutar? Casara-se? Morrera? Lembrava-se dele? Provavelmente. Ou não...

Pensou sobre o quanto uma menina que ele conhecera tão pouco intimamente conseguira satisfazer tanto os seus sonhos de menino. E o quanto era difícil, naquele momento, encontrar alguém que pudesse lhe trazer este nível de satisfação. A realidade era outra. As exigências eram outras. Perdera a inocência adolescente. Entrara pro mundo complexo e arredio dos relacionamentos adultos. Pensou nas meninas que se seguiram àquela primeira. Lembrou-se de cada rosto, cada sorriso, à medida que as músicas iam passando. O que teria acontecido com elas todas? De algumas ele ainda tinha uma notícia ou outra. Mas na maioria dos casos elas haviam sumido de sua vida. E, de repente, sentiu-se só. Chegou quase a admitir que queria alguém ao seu lado naquele momento. Alguém que ele pudesse segurar a mão e fingir ser seu namorado de longa data.

Decidiu parar com esse fluxo de pensamentos. Para baixo demais para o seu gosto. Mas quando sua música preferida terminou, todos aplaudiram menos ele. Ficou imóvel em sua cadeira. Pensando.

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